by Ademar Cavalcanti Silva Filho Ademar Cavalcanti Silva Filho

Desde a última semana, a partir da publicação do Decreto 9.142 de 22 de agosto de 2017, em que o Presidente Temer extinguiu a RENCA, se iniciou uma discussão no país sobre este ato. Imprensa, pessoas públicas nacionais e internacionais, ONGs, Políticos, tem se manifestado contra a extinção de uma imensa “Reserva Ambiental” na Amazônia Brasileira. Mas afinal o que realmente foi extinto por este decreto?

Percebo que as respostas mudam em função dos interesses de quem responde, mas não percebi por parte da grande Imprensa Nacional, um interesse genuíno e compromisso com a verdade em esclarecer os fatos, que estão disponíveis na INTERNET para quem quiser acessar. O foco das manchetes dos jornais televisivos e mídia em geral via de regra foram o da extinção de uma grande reserva ambiental na Amazônia, com mais de 40.000 km quadrados, com a indignação de pessoas públicas formadoras de opinião.

Basta consultar os extintos Decretos nº 89.404 de fevereiro de 1984 e nº 92.107 de dezembro de 1985, que altera o anterior, que os mesmos na verdade criaram uma “Reserva de Direitos Minerários” para o Governo Federal.

Este Decreto determina em seu artigo segundo que “ Os trabalhos de pesquisa destinados à determinação e avaliação das ocorrências de cobre e seus associados na área restrita em seu artigo primeiro, caberão com exclusividade, à COMPANIA DE PESQUISA DE RECURSOS MINERAIS”

Em seu artigo terceiro foi estabelecido que “ As concessões de lavra das jazidas de cobre e minerais a este associados, na área sob reserva, somente serão outorgadas às Empresas com que haja a CPRM negociado os resultados os respectivos trabalhos de pesquisa, na forma do decreto-lei nº 764 de 01 de agosto de 1969, com as alterações introduzidas pela Lei nº6.399 de 10 de dezembro de 1976”

Este decreto, de fato, colocou fim a conflitos de interesses entre o Governo Federal (Regime militar) e Empresas que já haviam requerido pesquisa mineral na área. O Documento RESERVA NACIONAL DE COBRE E SEUS ASSOCIADOS – SÍNTESE DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO elaborado pela CPRM em dezembro de 1989 é muito esclarecedor quanto aos direitos minerários existentes naquele momento e que foram, no meu entendimento, de certa forma congelados, por estes trinta e três anos, com a criação da RENCA.

Havia até 1988 um total de 416 áreas ou requerimentos de pesquisa, sendo que 196 destes foram anteriores ao decreto de constituição da reserva. A tabela abaixo mostra a distribuição dos requerimentos.

Como vivemos sempre no pais do futuro, o resultado prático deste fatídico decreto de criação da RENCA em 1984 foi empurrar para um futuro incerto os trabalhos de pesquisa mineral requisitados antes e depois do mesmo por Empresas Privadas e Estatais, conforme tabela acima e que foram colocados sob a responsabilidade da CPRM como atribuição exclusiva do Governo Federal.

Apenas para se ter uma idéia da importância mineral da RENCA, transcrevemos a seguir um trecho do item 3 do documento RESERVA NACIONAL DE COBRE E SEUS ASSOCIADOS – SÍNTESE DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO, citado acima.

“A reserva Nacional de Cobre e seus Associados está inserida em uma área, cujo contexto tectono-geológico é indicativo de potencialidade poliminerálica. Significativas anomalias geofísicas, realces geoquímicos em áreas localizadas e o panorama geoquímico-litologico regional denunciam para a área da reserva, alta favorabilidade metalogenética, similar à ambiência geológica da Província Metalogenética do Carajás.

“ Entretanto, a constatação e a caracterização de ambiências geológicas favoráveis a mineralizações, não asseguram a presença de depósitos minerais econômicos. Essas favorabilidades de caráter geológico e metalogenético, implica na realização de trabalhos sistemáticos e adequadamente orientados, contemplando mapeamento geológico, prospecção e pesquisa mineral, em escalas de detalhe.”

Resumindo, o Governo Federal praticamente sentou, por mais de 30 anos em cima de uma potencial província mineral do porte de Carajás e de outras existentes no mundo a exemplo de países como o Canadá, Austrália e África do Sul. Pergunto, estes países fariam o mesmo?

Se ainda restam dúvidas se a RENCA foi uma “Reserva de Direitos Minerários” ou uma “Reserva de Proteção Ambiental” basta acessar o site do ICMBio e verificar que dentre as 324 Unidades de Conservação Federais geridas por aquele Órgão não se encontra a RENCA.

Importante observar que várias unidades de conservação de uso sustentável e de proteção integral foram criadas em superposição parcial à área da RENCA, conforme tabela abaixo:

Observa-se que apenas a Estação Ecológica do Jarí, foi criada antes da criação da RENCA.

O fato é que agora qualquer atividade mineral na região, seja prospecção, pesquisa e eventualmente lavra, deverá se submeter e respeitar, ao que estabelece os Planos de manejo destas unidades de conservação, que restringem ou impedem a atividade de mineração. Deve-se citar também as restrições estabelecidas por terras Indígenas que se sobrepõe à RENCA.

Com relação a Terras Indígenas e Comunidades Quilombolas existentes na região os processos minerários deverão se submeter à Convenção 169 da OIT, isto é a uma Consulta Prévia, Consentida e Informada com estas comunidades, antes dos processos normais de autorização, como o Licenciamento Ambiental.

Hoje, antes de concluirmos este artigo o Governo Federal editou novo decreto cancelando o decreto nº 9.142 de 22 de agosto de 2017 anterior e detalha algumas regras, principalmente relativas a não permitir atividade mineral em áreas de unidades de conservação.

Este novo decreto de fato trás apenas regulamentações que já existem em outros dispositivos legais, portanto tratando-se apenas de uma satisfação e justificativas para as pressões que ocorreram na semana passada.

De fato toda esta confusão tem como causa falhas na gestão da coisa pública. Se a criação da RENCA, lá no passado era estratégico para o Pais, por que se permitiu a criação de Unidades de Conservação Ambiental, conforme indicado na tabela acima interferindo, se sobrepondo com a poligonal de criação da RENCA, claramente definida por coordenadas no decreto de nº Decretos nº 89.404 de fevereiro de 1984 ?

Por que se levou 32 anos para se pensar em iniciar as atividades de detalhamento geológico, prospecção e pesquisa mineral nesta potencial província mineral, restringindo-se estes serviços à iniciativa governamental ?

Por que os direitos minerários das Empresas que requereram as áreas no passado foram cerceados por mais de trinta anos?

Coisas da Gestão Pública

Fontes de Informações:

– brasilmineral.com.br

– Reserva Nacional de Cobre e seus Associados – Síntese do Conhecimento Científico – CPRM – Dezembro de 1989

– g1.globo.com

– Diário Oficial da União

Ademar Cavalcanti

Consultor – SCI FRACTAL – Sistema de Consultoria Integrada para Sustentabilidade Ltda.